quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Capítulo 21

01 de Dezembro de 2009, Dia Ano Novo.

A mocinha de olhos verdes preparou-se para o Ano Novo. Estava ansiosa pela entrada de 2010. Sentia que sua vida iria mudar.
Ela e a mãe se aprontaram, o irmão passou a tarde, com a cunhada e a sobrinha, até então ainda uma, para levarem-nas até a casa da sogra dele. Deixaram o mala do padrasto em casa, com a princesinha da casa, a gata Milly. Ia ser uma noite como outra qualquer de virada.
Na casa da sogra dele havia a festa de aniversário, pois o irmão de sua mulher fazia aniversário no dia 31. E assim foi aquela noite, os parabéns, conversas, orações, os fogos, comemorações, desejos e promessas pro ano novo. Por volta de 2 da manhã, as duas já estavam de volta em casa, sendo deixadas pelo irmão/ filho no portão.
O dia seguinte também foi como outro qualquer. Pelo menos até cerca de duas da tarde. Mas não adiantemos a história. Naquela manhã, a mocinha acordou tarde, tomou café. Por volta das 13:00hs ela almoçou, sua mãe havia feito pavê, uma guloseima a qual a garota gosta muito. E então foram assistir filme. O filme escolhido para aquela tarde foi Bastardos Inglórios, com um ator que ela gostava muito, Brad Pitt.
Elas se acomodaram, a jovem deitada em sua cama, a mãe no sofá de dois lugares que tinha no quarto da filha. O filme começou, mas não durou muito. Cerca de 14:00hs, começou a trovejar, o céu escureceu. Viria chuva feia.
Rapidamente as duas tiraram o filme, desligaram a televisão e a mãe partiu pegar alguns panos e tapar os ralos do banheiro e o padrasto a erguer algumas coisas que ficavam próximas do chão. Nas últimas semanas a casa havia enchido alguns poucos centímetros na chuva forte. Esperaram.
A chuva veio forte, mas logo em seguida ficou mais fina e fraca. Parecia uma garoa. Porém, o terreno ao fundo da casa alugada estava cheio. A casa ainda nada. Esperaram. Foi quando notaram que havia algo de errado. A água nos fundos estava bem mais alta que o de costume, e avançando. O terreno, que era mais baixo nos fundos, onde passava um córrego, ia subindo gradativamente até a frente. A casa era geminada, o filho da dona morava com a mulher onde dava para a frente do terreno. A entrada da casa da garota de cabelos castanhos era no corredor lateral. A garagem e o portão que davam para a rua, eram ainda mais altos, logo após uma pequena escada de uns 15 degrais em um morrinho onde ficava o jardim.
Olhavam pela janela do banheiro ou dos quartos, a água já estava na lavanderia da casa, já havia passado à muito o fogão de lenha da dona da casa. E nada de água ainda do lado de dentro. Estranharam. O padrasto saiu e trancou a porta lateral da cozinha, vedando com panos e madeira, depois pulou a janela do quarto da garota. Ela estava assustada. Todos estavam.
Foi então que aconteceu. A água subiu até quase o nível da janela do quarto de sua mãe. Os dois, mãe e padrasto, não se mantinham parados, colocando para o mais alto possível, tudo que consideravam importante, televisões e caixas com documentos, arrancaram os colchões das camas, ergueram-os com as cadeiras sobre a mesa da cozinha, quase no teto, e ali em cima colocaram mais coisas. Mas a água não esperou.
A jovem estava no quarto quando ouviu o barulho da tranca da porta da cozinha ruindo. A água invadia rapidamente o lugar, enchendo a casa da parte alta do terreno para a baixa. O padrasto colocou um bujão de gás em frente a porta, mas ele não suportava a força da água. A jovem foi designada a ficar, com todo o esforço possível, segurando e embarreirando a água, até que tivessem tempo de tirar e subir mais coisas pra cima do móvel. A gatinha estava assustada, sobre os colchões na cozinha.
Ao terminarem, a garota foi liberada. O padrasto assumiu o lugar dela em frente à porta. Ela correu para o quarto, a mãe a chamava. Lá dentro, sua mãe entregou a ela seu notebook, seu celular e o do padrasto, mandando-a sair pela janela do quarto. Ela saiu. Ao pular do lado de fora, a água bateu quase em seu peito. O muro que separava o terreno da casa do vizinho era irregular e ela conseguiu subir, com esforço, a parte mais baixa do muro. Pegou tudo que a mãe lhe entregou e colocou sobre o telhado, que ficara baixo, à altura da jovem sobre o muro. Em seguida, foi a vez da gata. Ela pegou sua princesinha e soltou-a no muro. Ela correu para a sacada do quarto do vizinho e lá ficou, encolhida, levemente molhada e muito assustada. A jovem pôde ver, de relance, a mãe presa dentro do seu quarto, tentando livrar-se da mesa do computador e do sofá, que haviam virado no quarto cheio de água e impediam a passagem pela porta. Ela conseguiu.
Os vizinhos da casa da frente já estavam retirando suas coisas. Lá ainda não estava cheio. A mulher que lá morava, apesar de não ser a pessoa à qual a jovem mais gostava, já começava a chorar, mas a ajudou a descer do muro, segurou seu notebook e os celulares e os entregou assim que a jovem estava em terra firme. Ela não pensou muito, colocou o notebook sobre as coisas dos vizinhos e, inocentemente, enfiou os dois celulares nos bolsos da capri que vestia. O padrasto gritava pela mãe dela, ela seria a próxima a sair. A moça não pensou naquela hora, esqueceu-se dos celulares nos bolsos. Ao ver a mãe apontar pela janela, jogou-se na água, afim de ser uma ponte para que a mãe tivesse firmeza na água, que estava alta e com correnteza, o que só a fazia preocupar ainda mais, já que a mãe era alguns centímetros mais baixa que ela e não sabia nadar. Deu certo. Não houve nem mesmo um escorregão.
O padrasto foi o último a sair. Assim que soltou a porta, ela se escancarrou, a parte de baixo da porta de metal completamente amassado e torto. Ele fechou as janelas, para impedir que alguma coisa viesse a sair flutuando e ser levada.
Assim que estavam todos do lado de fora, a menina voltou ao muro, pulou o balaustre da sacada do vizinho e pegou sua gatinha. Desceu. Ela estava firme em seu desespero. O padrasto tinha um fusca amarelo, foi o abrigo deles durante a chuva. Não havia mais telefones, só então a moça se deu conta e começou a sentir-se culpada. Desabou. Chorava baixinho apertando a gata que escondia-se onde conseguia. Na falta dos celulares, o padrasto tentou ir ao orelhão mais próximo, no fim da rua. Só então se deu conta do tamanho da tragédia. A avenida estava tomada de água. Voltou com as notícias, mais choro, esbravejamento. Ficaram algumas horas ali. Quando a chuva deu trégua, ele ligou o barulhento fusca e se dirigiram à casa dos tios da moça, que moravam em um bairro do outro lado da cidade e eram a ajuda mais próxima que tinham.
Saíram. Deixaram tudo pra trás. A avenida já tinha escoado um pouco da água, dava para passar. Quando chegaram próximos à rodoviária, viram que boa parte das casas que ali tinham, no morro, vieram a baixo. Havia bombeiros e ambulâncias estacionados, pessoas chorando em toda parte. O irmão da mãe dela não estava em casa, mas a tia os recebeu e os acomodou na casa. Eles estavam sem luz, sem água. A garota foi acomodada num pequeno quarto que era o escritório, com sua gatinha, que era ao lado do quarto das primas. Apesar de mais velhas, a moça gostava da companhia delas. A mãe e o padrasto foram instalados no quarto de hóspedes que ficava à beira da piscina, no porão. Ela ficou um bom tempo chorando agarrada à mãe, chorando. Passou a noite assim, até dormir, sendo vencida pela exaustão.
Ali começava o Ano Novo dela. O ano tão esperado e que veio de forma tão desastrosa.

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