segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Capítulo 22

Casa dos tios, 02 de Janeiro de 2012.

A garota de olhos claros acordou cedo. O barulho da movimentação das pessoas na casa e o sol entrando pela janela a fizeram se esforçar para abrir os olhos.
Ela viu a hora, ainda era cedo, deitou-se em seu colchão outra vez e tampou a claridade com a coberta. Sua gatinha, presa no quarto com ela, pulava e corria de um lado para o outro, espreitando a movimentação pela janela, ansiosa por sair também.
Algum tempo depois, a garota se levantou. A mesa do café da manhã ainda estava posta e ela sentou-se para comer, após ter se trocado e colocado a ração da gatinha. Ela terminou de comer e foi para o sofá, tentar passar o tempo.
Ela sentia-se só. Uma caminhonete, alguns conhecidos, iam e voltavam de sua casa trazendo coisas enlameadas que, de certa forma, poderiam ser salvas. Voltaram na hora do almoço. Sua mãe contou a ela a situação. A casa estava completamente enlameada. Muita coisa se perdeu. Na parte mais baixa, a água chegou a 2,10 metros.
Ela quis ir ver, quis ir ajudar. A mãe não deixou. Disse que os parentes, alguns conhecidos e amigos, tinham ido ajudar. Logo, eles voltaram, deixando a moça à sós na casa outra vez.
A garota de cabelos castanhos chorou, queria desabafar, mas sabia que o caderno que guardava embaixo da cama havia ido pro lixo. Seus poemas, suas histórias, tudo perdido. Ela procurou pela casa, não encontrou uma folha que pudesse usar. Encontrou uma caneta azul que ficava ao lado da agenda de telefone da tia. Pensou em arrancar uma página, mas também pensou que não seria certo. Voltou à mesa, pegou um guardanapo de papel que ainda restava no pacote após o almoço. Escreveu, ali mesmo, o seguinte:
"É muito difícil você olhar para trás e ver que à dois dias sua vida estava como deveria estar e que, no dia seguinte, não havia mais nada. Pra alguém, como eu, que não via a hora de 2009 acabar, o dia 1º de Janeiro de 2010 foi traumatizante.
A chuva que não parava, água por todos os lados, levando embora tudo que eu tinha e gostava. Não gosto de admitir, mas as águas levaram também algo ainda mais precioso: minha esperança.
Eu tinha esperança que em 2010 minha vida fosse mudar, mas recomeçar tudo do zero não estava nos planos.
Você sabe qual é a sensação de perder algo que estava com você por sua vida toda? Bom, não sei explicar, mas é quase como se um pedaço de ti tivesse desaparecido. Todos te dizem que o importante é você estar vivo e bem, que os bens materiais você conseguirá novamente. O que ninguém para pra pensar, antes de dizer isso, é que você pode estar vivo, mas perdeu parte da sua vida ali e que, bens materiais podem sim ser recuperados, mas aquilo que tinha valor sentimental, aquilo que te era especial e que você guardava com todo carinho, nada vai substituir.
Hoje é dia 2 de Janeiro de 2010, estou na casa dos meus tios, usando roupas emprestadas e tomando conta da minha gatinha, a Milly, que ficou muito assustada com tudo isso e ainda está estranhando um pouco a nova casa em que está. Eu estou aqui sozinha, passando o tempo, escrevendo minha triste história em um guardanapo, enquanto meus tios, minha prima, mãe e padrasto estão lá em casa, tentando salvar o que sobrou e jogando fora o entulho que as águas deixaram depois de baixar.
A cidade de Guararema, onde nasci, mas nunca tive muito orgulho de morar, está vivendo sua pior catástrofe: Morros desmoronaram, casas foram inundadas, pessoas morreram, a cidade ficou isolada, alguns lugares (como aqui) estão sem luz desde ontem à tarde.
A situação está feia e estou bem desanimada, talvez esteja um pouco mais forte que ontem, depois de ter chorado um dia inteiro, mas ainda estou desnorteada.
Estou com saudade da minha vida e das coisas que sei que não terei mais. Pra falar a verdade, estou com vontade de sumir.
No momento não tenho planos e nem mesmo sei mais o que fazer diante de tudo isso. Bem, eu queria uma "vida nova", vou ter que me esforçar para construí-la agora. Eu queria "mudar" minha vida, bem, agora eu poderei fazer dela o que "bem entender".
Não vai ser fácil, mas agora é seguir em frente, porque atrás de mim...não restou nada."


As lágrimas que brotavam dos olhos da garota molharam algumas partes do guardanapo, borrando de leve a tinta da caneta que havia ali.
No final do dia, tudo o que era possível ser resgatado, estava no quintal da tia, manchando tudo de marrom, o barro com um cheiro forte de sujeira. Com ajuda da tia, da sogra do irmã e da cunhada, aos poucos tudo foi sendo lavado, sendo selicionado entre o lixo e uma segunda chance. Foram tempos difíceis mas, aos poucos, eles se reerguiam.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Capítulo 21

01 de Dezembro de 2009, Dia Ano Novo.

A mocinha de olhos verdes preparou-se para o Ano Novo. Estava ansiosa pela entrada de 2010. Sentia que sua vida iria mudar.
Ela e a mãe se aprontaram, o irmão passou a tarde, com a cunhada e a sobrinha, até então ainda uma, para levarem-nas até a casa da sogra dele. Deixaram o mala do padrasto em casa, com a princesinha da casa, a gata Milly. Ia ser uma noite como outra qualquer de virada.
Na casa da sogra dele havia a festa de aniversário, pois o irmão de sua mulher fazia aniversário no dia 31. E assim foi aquela noite, os parabéns, conversas, orações, os fogos, comemorações, desejos e promessas pro ano novo. Por volta de 2 da manhã, as duas já estavam de volta em casa, sendo deixadas pelo irmão/ filho no portão.
O dia seguinte também foi como outro qualquer. Pelo menos até cerca de duas da tarde. Mas não adiantemos a história. Naquela manhã, a mocinha acordou tarde, tomou café. Por volta das 13:00hs ela almoçou, sua mãe havia feito pavê, uma guloseima a qual a garota gosta muito. E então foram assistir filme. O filme escolhido para aquela tarde foi Bastardos Inglórios, com um ator que ela gostava muito, Brad Pitt.
Elas se acomodaram, a jovem deitada em sua cama, a mãe no sofá de dois lugares que tinha no quarto da filha. O filme começou, mas não durou muito. Cerca de 14:00hs, começou a trovejar, o céu escureceu. Viria chuva feia.
Rapidamente as duas tiraram o filme, desligaram a televisão e a mãe partiu pegar alguns panos e tapar os ralos do banheiro e o padrasto a erguer algumas coisas que ficavam próximas do chão. Nas últimas semanas a casa havia enchido alguns poucos centímetros na chuva forte. Esperaram.
A chuva veio forte, mas logo em seguida ficou mais fina e fraca. Parecia uma garoa. Porém, o terreno ao fundo da casa alugada estava cheio. A casa ainda nada. Esperaram. Foi quando notaram que havia algo de errado. A água nos fundos estava bem mais alta que o de costume, e avançando. O terreno, que era mais baixo nos fundos, onde passava um córrego, ia subindo gradativamente até a frente. A casa era geminada, o filho da dona morava com a mulher onde dava para a frente do terreno. A entrada da casa da garota de cabelos castanhos era no corredor lateral. A garagem e o portão que davam para a rua, eram ainda mais altos, logo após uma pequena escada de uns 15 degrais em um morrinho onde ficava o jardim.
Olhavam pela janela do banheiro ou dos quartos, a água já estava na lavanderia da casa, já havia passado à muito o fogão de lenha da dona da casa. E nada de água ainda do lado de dentro. Estranharam. O padrasto saiu e trancou a porta lateral da cozinha, vedando com panos e madeira, depois pulou a janela do quarto da garota. Ela estava assustada. Todos estavam.
Foi então que aconteceu. A água subiu até quase o nível da janela do quarto de sua mãe. Os dois, mãe e padrasto, não se mantinham parados, colocando para o mais alto possível, tudo que consideravam importante, televisões e caixas com documentos, arrancaram os colchões das camas, ergueram-os com as cadeiras sobre a mesa da cozinha, quase no teto, e ali em cima colocaram mais coisas. Mas a água não esperou.
A jovem estava no quarto quando ouviu o barulho da tranca da porta da cozinha ruindo. A água invadia rapidamente o lugar, enchendo a casa da parte alta do terreno para a baixa. O padrasto colocou um bujão de gás em frente a porta, mas ele não suportava a força da água. A jovem foi designada a ficar, com todo o esforço possível, segurando e embarreirando a água, até que tivessem tempo de tirar e subir mais coisas pra cima do móvel. A gatinha estava assustada, sobre os colchões na cozinha.
Ao terminarem, a garota foi liberada. O padrasto assumiu o lugar dela em frente à porta. Ela correu para o quarto, a mãe a chamava. Lá dentro, sua mãe entregou a ela seu notebook, seu celular e o do padrasto, mandando-a sair pela janela do quarto. Ela saiu. Ao pular do lado de fora, a água bateu quase em seu peito. O muro que separava o terreno da casa do vizinho era irregular e ela conseguiu subir, com esforço, a parte mais baixa do muro. Pegou tudo que a mãe lhe entregou e colocou sobre o telhado, que ficara baixo, à altura da jovem sobre o muro. Em seguida, foi a vez da gata. Ela pegou sua princesinha e soltou-a no muro. Ela correu para a sacada do quarto do vizinho e lá ficou, encolhida, levemente molhada e muito assustada. A jovem pôde ver, de relance, a mãe presa dentro do seu quarto, tentando livrar-se da mesa do computador e do sofá, que haviam virado no quarto cheio de água e impediam a passagem pela porta. Ela conseguiu.
Os vizinhos da casa da frente já estavam retirando suas coisas. Lá ainda não estava cheio. A mulher que lá morava, apesar de não ser a pessoa à qual a jovem mais gostava, já começava a chorar, mas a ajudou a descer do muro, segurou seu notebook e os celulares e os entregou assim que a jovem estava em terra firme. Ela não pensou muito, colocou o notebook sobre as coisas dos vizinhos e, inocentemente, enfiou os dois celulares nos bolsos da capri que vestia. O padrasto gritava pela mãe dela, ela seria a próxima a sair. A moça não pensou naquela hora, esqueceu-se dos celulares nos bolsos. Ao ver a mãe apontar pela janela, jogou-se na água, afim de ser uma ponte para que a mãe tivesse firmeza na água, que estava alta e com correnteza, o que só a fazia preocupar ainda mais, já que a mãe era alguns centímetros mais baixa que ela e não sabia nadar. Deu certo. Não houve nem mesmo um escorregão.
O padrasto foi o último a sair. Assim que soltou a porta, ela se escancarrou, a parte de baixo da porta de metal completamente amassado e torto. Ele fechou as janelas, para impedir que alguma coisa viesse a sair flutuando e ser levada.
Assim que estavam todos do lado de fora, a menina voltou ao muro, pulou o balaustre da sacada do vizinho e pegou sua gatinha. Desceu. Ela estava firme em seu desespero. O padrasto tinha um fusca amarelo, foi o abrigo deles durante a chuva. Não havia mais telefones, só então a moça se deu conta e começou a sentir-se culpada. Desabou. Chorava baixinho apertando a gata que escondia-se onde conseguia. Na falta dos celulares, o padrasto tentou ir ao orelhão mais próximo, no fim da rua. Só então se deu conta do tamanho da tragédia. A avenida estava tomada de água. Voltou com as notícias, mais choro, esbravejamento. Ficaram algumas horas ali. Quando a chuva deu trégua, ele ligou o barulhento fusca e se dirigiram à casa dos tios da moça, que moravam em um bairro do outro lado da cidade e eram a ajuda mais próxima que tinham.
Saíram. Deixaram tudo pra trás. A avenida já tinha escoado um pouco da água, dava para passar. Quando chegaram próximos à rodoviária, viram que boa parte das casas que ali tinham, no morro, vieram a baixo. Havia bombeiros e ambulâncias estacionados, pessoas chorando em toda parte. O irmão da mãe dela não estava em casa, mas a tia os recebeu e os acomodou na casa. Eles estavam sem luz, sem água. A garota foi acomodada num pequeno quarto que era o escritório, com sua gatinha, que era ao lado do quarto das primas. Apesar de mais velhas, a moça gostava da companhia delas. A mãe e o padrasto foram instalados no quarto de hóspedes que ficava à beira da piscina, no porão. Ela ficou um bom tempo chorando agarrada à mãe, chorando. Passou a noite assim, até dormir, sendo vencida pela exaustão.
Ali começava o Ano Novo dela. O ano tão esperado e que veio de forma tão desastrosa.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Capítulo 20

Los Angeles, Califórnia. Bar The Planet, sexta à noite.

Assim que conheceu Shane, Angela ficou fascinada por ela. E era mútuo. Elas ficaram bem unidas, quase sempre estavam juntas.
A loira ainda morava na casa que era de Lucas, mas o "pai" raramente era visto por ali. Shane a visitava todos os dias, quando não acontecia o contrário. Com sua fama de pegadora, a andrógena rapidamente conseguiu arrancar alguns beijinhos de Angela, poucos dias depois de conhecê-la, mesmo a loira dizendo que estava ficando com uma francesinha que havia conhecido antes de Shane. Elas se sentiam atraídas, era automático o beijo quando estavam juntas. Mas os tempos de beijos duraram pouco.
Em vez disso, Angela e Shane se tornaram parceiras. Talvez por assossiação, a loira ganhou a fama de pegadora também, mesmo demonstrando que não era de ficar com todas. Sempre que Shane dava festas, Angela estava no bar, assim como na casa da morena, jogando Verdade ou Desafio, jogo esse no qual ela era perita, amava desafios e encarava o que viesse pela frente.
Em meio à todos esses acontecimentos, Angela conheceu no bar, ou através de Shane, a linda e divertida Amber, sua sócia no lugar, a amalucada DJ Montilla, a irmã de Shane, Melissa, as melodramáticas Alliana e Mel, entre tantas outras garotas legais, ou nem tanto, que frequentavam ali.
Já com Jodi, a parceria era mesmo de irmãs. Estavam também sempre juntas e conversando, e foi pela irmã, surda, que Angela se empenhou em aprender libras.
Jodi tinha uma filhinha, que a loira de olhos azuis considerava como sua sobrinha, e se davam bem. Ela gostava de mimar a menina, brincando e correndo, sempre tinha ânimo para estar com elas.

Noite de sexta, em frente ao computador.

A garota de olhos verdes estava mais animada que nunca. Havia encontrado duas amigas com as quais se identificara muito. Ainda por cima, conheceu a irmã de Marta, Ana, e mais algumas outras meninas das quais não tinha muito contato no mundo "exterior".
Ela e Marta estava sempre combinando os jogos, Marta agitava a galera para se juntar e "rodar a garrafa".
Com Manu, ela passava horas também conversando, até que pegaram o vício de jogar Poker pelo MSN, foi a perdição das duas. Estavam viciadas naqueles joguinhos, se divertiam muito juntas.
E foi assim durante algum tempo. Manu e Marta começaram a brigar demais e a moça de cabelos castanhos passou a sentir-se culpada. Como se tivesse separado aquela dupla que ambas eram antes de conhecê-la. No fim, até mesmo por insistência de Manu, ela deixou de lado o sentimento de culpa. Resolveu não se meter com o que acontecia entre as duas. Era amigas delas independende de ambas se falaram ou não, isso não mudaria.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Capítulo 19

Las Vegas, Nevada. Outubro de 2009.

Angela sentiu que passou os melhores dias de sua vida ao lado de Marg. Estranhou, apenas, não se recordar dos detalhes.
Quando se despediram, ela sentiu o coração apertar, lembrava-se de cenas que não eram, exatamente, lembranças de seus dias com a Marg. Parecia tão mais...real. Vinha de dentro dela, era tão íntimo que Angela chegava a se assustar.
Ela partiu numa tarde, seria muito difícil ver Marg outra vez, ela sabia disso, mas o tempo que passou ali, com ela, foi especial e Angela sabia disso. Embora ainda não entendesse o porquê.
Ela voltou para casa de Lucas, em Los Angeles. No avião, pensava e tentava decifrar tudo que, de fato, havia acontecido naqueles dias, mas notou que o que ela viveu ali não era tão intenso quanto o que ela sentia por dentro de si.

Estado de São Paulo, duas semanas antes do início de Novembro.

Era o último ano da jovem de olhos claros no colégio. Sua turma queria fazer para a despedida. Planejaram passar o dia em uma chácara, no feriado de Finados, no dia 02/11.
A moça, junto à sua mãe, conseguiram que a patroa da mesma emprestasse o sítio para que passassem os dias. Foi muita zoação, muita piscina e conversa. Fotos e videos. E até mesmo a tentativa frustada de fazer uma batida de morango sem liquidificador. Foi uma cena hilária para uma coisa com um gosto tão horrível. Lúcia, Tassi e Fê, suas amigas, picaram os morangos, jogaram dentro de uma garrafa pet com vinho e leite condensado e começaram a chacoalhar. Depois que os braços estavam doendo e o líquido lá dentro parecia estar "pronto", despejaram em uma caneca. O que viram foram morangos esmagados caindo junto à uma bebida impossível de engolir. Nem o mais bêbado conseguiu tomar aquilo. Mas a diversão estava garantida naqueles dois dias.

Los Angeles, Califórnia, Meados de Novembro de 2009.

Angela andava por aí, quando passou em frente à um barzinho que chamou sua atenção. O nome, The Planet, destacado acima das portas, assim como o fato de 99% das pessoas dentro dele serem mulheres, fez com que ela entrasse ali também. Foi naquela noite que a loira conheceu Shane, a dona do lugar. Uma andrôgena extremamente legal, com fama de pegadora, entre outras coisinhas. Ela ficou fascinada com o lugar, com Shane, foi uma amizade quase instantânea. Por intermádio de Shane, Angela conheceu Jodi, com a qual se identificou tanto que sentiu que sua família havia aumentado. Eram irmãs de consideração.

Casa da moça de cabelos longos, à noite. Meados de Novembro de 2009.

Naquela noite, a jovem, em frente à seu computador, partiu para um lugar diferente em seus jogos. Ali, ela conheceu Marta, a primeira com quem teve contato nesse "mundo novo" em que entrava. Em seguida, através dela, conheceu Manu, sua mana de coração. A partir daí, o encontro entre elas todos os dias era praticamente certo, conversavam, combinavam seus próximos jogos, riam. A garota estava feliz, empolgada.
- Vai ser demais, Angela! - ela sorria, enquanto desligava o pc, altas horas, para ir dormir.

Capítulo 18

Poços de Caldas, Minas Gerais, 11 de Outubro de 2009.

A jovem de olhos verdes quase não dormiu na noite anterior. Vez ou outra acordava, apenas para olhar Luna dormindo, na cama de solteiro logo ao seu lado, pouco acima de seu colchão no chão.
Após cair no sono novamente, o dia amanheceu e sua querida Luna havia acordado. O dia era de festa, era o aniversário da moça de olhos claros. Tanto Luna quanto a tia parabenizaram a jovem, elas logo se arrumaram e saíram, para mais um dia de turismo e fotografias. Ela não poderia estar mais feliz. Aquele dia passou rápido, mas foi perfeito. Leo, o garoto que acreditava que não ia ligar, realmente ligou em seu aniversário. Assim como sua mãe e alguns poucos amigos e parentes.
Ao voltarem, à noite, Rita saiu para resolver algumas coisas, deixando as duas jovens sozinhas. A porta do banheiro não fechava. A garota fora tomar seu banho e tentou, forçou a porta de todas as formas, mas o medo de ficar presa ali dentro depois foi mais forte. Apenas a encostou bem e tomou seu banho. Seu susto foi imenso ao sentir algo gelado em sua perna, estando sob o chuveiro quente. Ao olhar para trás, quase morreu de vergonha e teve vontade de matar Luna. Ela estava ali, do outro lado do box de vidro, com um rodo na mão, cutucando-a e olhando-a de cima a baixo, nua. A jovem desligou o chuveiro e tentou se encolher o máximo possível, tentando ficar invisível, em vão. Ameaçou. Xingou. Esperneou, tentou acertá-la. Luna decidiu deixá-la terminar o banho. E foi isso que a jovem fez, rapidamente. Ao sair do box, percebeu que a mineirinha tinha levado suas roupas. Mas deixara a toalha, estava de bom tamanho. Enrolou-se e saiu do banheiro. Luna não estava visível. Foi ao quarto, pegou o pijama de frio que havia levado na mochila, mas desistiu. Estava muito quente. Partiu pelo apartamento atrás de Luna. O notebook estava sobre o sofá cama, na sala, vazio. A cozinha também estava vazia, e a lavanderia.
- Onde ela se meteu?
Havia um quartinho nos fundos do apartamento, Luna estava ali, deitada sobre um colchão no chão, um travesseiro abaixo da cabeça, mostrando claramente que as roupas da garota estavam ali. Ela tentou negociar, tentou pegar à força suas roupas, mas ambas rolaram pelo colchão, Luna aproveitando-se para tirar casquinhas da jovem, tentando a todo custo puxar sua toalha. Quando percebeu que estava quase recuperando a roupa roubada, a mineirinha, mais alta e até mais forte que a paulistinha, levantou-se e ficou fazendo-a de boba, trocando a roupa de mão e colocando atrás do corpo, contra a parede, para que não fosse pega. O resultado disso? A jovem teve que abrir sua toalha, deixar que Luna visse seu corpo, só então teve suas roupas de volta. Correu para o quarto e se vestiu.
Ao voltar para a sala, a mocinha já estava no notebook. Ela ajeitou-se perto dela, para ver tv e alguma coisa que a amiga estivesse vendo no note. Além do que, para dar um tapa ou outro por ser tão cara de pau. Mas se gostavam demais. Aquela briguinha acabou em amassos no sofá. Depois em risos.
Depois da casa da tia Rita, Luna levou a amiga para a casa da mãe dela, em outra cidade de Minas. A casa da temída mãe dela. A jovem de olhos claros não tinha uma impressão das melhores, mas tentou deixar com que o dia que passou lá fosse o melhor possível. A noite foi muito legal, com os amigos de sua querida e amada amiga, uma festinha na praça da cidade, bexigas de hélio, risos. Era muito difícil as duas ficarem a sós, a mãe da mineirinha marcava pesado, mas elas conseguiram raras vezes, trocar um beijo ou outro.
No dia seguinte, à tarde, lá estava a moça com seus 18 anos recém completos na rodoviária. Esperaram o ônibus, ela e sua amiga, por algum tempo. Conversaram, até o momento que o ônibus encostou na plataforma. O coração apertou. Demoraram-se o máximo possível. A mocinha de cabelos claros foi a última a embarcar. Permaneceu todo o tempo abraçada à sua querida.
- Posso te morder?
- Pode. (risos nervosos pela separação)
A mineirinha mordeu, delicadamente, e com toda a força que possuía, o pescoço da amiga. Abraçada a ela, a jovem de olhos verdes (ou azuis, como ela insistia em dizer), sentia seu cheiro, tentava memorizá-lo. Teve de embarcar. Da janela do ônibus, acenou uma última vez pra amiga. E então o ônibus partiu. Ela se viu chorando.As lágrimas desciam compulsivamente enquanto um fiscal passava por ela pedindo as passagens. Pensou que a moça estava passando mal. Ela sorriu, balançou a cabeça negativamente. Ele se foi. Ela encostou a cabeça no vidro e voltou a chorar. Olhava as paisagens que traziam tantas lembranças a ela e não conseguia se controlar. Sentia, sabia, que ali, naquele lugar, foi onde se sentiu mais livre, onde se sentiu mais feliz, onde ela pôde ser quem ela sempre quis: Ela mesma.
O resto da viagem foi apenas isso, nostalgia e melancolia. Sozinha, sem ninguém para conversar. Ao entrar em São Paulo outra vez, o trânsito foi seu maior inimigo. Como tudo aquilo demorou. Ao chegar na plataforma, reviu a mãe, abraçou-a, sentia saudades da mãe, mas morria de saudade daquele lugar, do que viveu. Sentia que jamais voltaria à acontecer. A volta para casa foi mais um sofrimento, mais duas horas de viagem até chegar em sua casa. E então, poder dormir e voltar, em seus sonhos, para aquele lugar, com aquela a quem ela queria tão bem.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Capítulo 17

Rodoviária de Poços de Caldas, Estado de Minas Gerais, 10 de outubro de 2009.

A garota chegou, enfim, ao seu destino. Desceu com o amigo de viagem dentro da rodoviária, mas mal teve tempo de se despedir dele, sua amiga a agarrou, abraçou tão forte que quase rasgou sua orelha por causa do brinco. Foi esmagada. Ambas riam muito.
Ela finalmente conseguiu desvencilhar-se dos braços de Luna e desperdir-se do amigo, que prometeu:
- Te ligo amanhã para te dar parabéns.
Ela sorriu, tinha certeza de que ele não iria ligar.
Luna apresentou sua tia à amiga recém-chegada. Tímida, cumprimentou a mulher com um sorriso. Havia uma terceira pessoa, uma garota que morava com elas no apartamento. Luna não parava de falar e as duas aproveitavam para rir muito enquanto caminhavam em direção ao carro da tia Rita.
Ela as levou ao shopping ali perto, a jovem tomou um sorvete enquanto sua amiga e a tia esperavam a senha do lanche. Quando, finalmente, foi chamada, Luna foi buscar seu lanche, voltou com ele e o colocou na mesa. Foi aí que aconteceu o maior mico da tarde, motivo de indecisão entre risadas, fingir que não conhecia, ou ajudar Luna.
A moça de olhos verdes empurrou, de leve, o banco da amiga para trás. Ao fazer isso, o banco soltou um ruído e Luna olhou-a, ela sorriu, acreditando ter sido descoberta. E foi quando Luna sentou. Ela não acreditou quando viu a amiga indo em direção ao vazio e sentando no chão com as pernas pro ar, numa queda vergonhosa. Não teve como não rir. Tia Rita não sabia se a ajudava ou se ria, acabou caindo na gargalhada. Um senhorzinho que estava ali por perto foi quem ajudou Luna a levantar-se. Ela estava vermelha como uma pimenta malagueta. Fuzilou os olhos verdes da amiga, embora risse, estava morrendo de vergonha. Queria matar a amiga. Mas acabou que tudo foi esquecido, após algumas desculpas e reclamações, tudo terminou em risadas.

Las Vegas, Nevada. Outubro de 2009.

Pela primeira vez, o encontro com Marg foi na casa dela. Não em um cassino, não em um hotel, mas na casa dela. E Angela percebeu que nunca poderia ficar mais íntimo.
Assim que chegaram de viagem, o tour pela cidade foi deixado de lado, foram tomar um sorvete e, em seguida, direto para a casa dela. Foi lá que ela ficou instalada pelos próximos dias.

Apartamento da tia Rita, Fim da tarde/ início da noite.

Assim que o episódio do shopping esfriou, a colega que estava junto voltou a rodoviária para viajar, as três entraram no carro e foram para casa.
Luna veio no banco de trás com a amiga, realmente enchendo o saco da garota, mas elas riram muito, foi o que importou. O carro entrou no estacionamento do prédio, elas desceram e subiram alguns lances de escadas para chegar ao apartamento. Lá, a moça deixou sua mochila guardada no guarda-roupas de Luna, a qual mostrou algumas coisas pra ela que tinha: óculos escuros, um sapo de pelúcia, chaveiros, contando a história de cada um.
Em um dado momento, a tia de Luna foi tomar banho. Foi o momento que a garota esperava para "atacar" a amiga. Encostou-a na janela, beijou-a. Quase a jogou janela afora, de tanto entusiasmo. Riram. Continuaram. Lu, mais alta que a garota, foi posta contra a janela, bateu com a cabeça no vidro, riram ainda mais. Mas curtiram o momento enquanto puderam. Assim que a tia saiu do banheiro, ambas estavam recompostas, como se nada houvesse acontecido.
Quando foi chegando a noite, as meninas de arrumaram e Luna foi levar a garota de olhos verdes (que, para ela, eram azuis) à praça algumas quadras abaixo, sairiam para passear.
Algumas voltas depois na praça, sendo que passaram por um grupo de garotos algumas porções de vezes, um dos rapazes veio para o lado delas e sussurrou:
- Menina emo.
Luna olhou imediatamente para a amiga.
- Nem vem, Lu. Você que está de chaupeuzinho xadrez e blusa de bolinhas coloridas. Não tenho nada de emo, foi para você.
Começou a rir. Lu se irritou.
- Emo? Eu? Ele vai ver quem é emo.
Só fez a amiga rir mais. Luna tinha uma mania de ficar batendo no bumbum da amiga. Quando passavam pelos rapazes, se juntavam ainda mais. As duas tentaram sentar em algumas barras que havia na praça, um canto meio escuro. Os caras passaram por elas, voltaram, passaram outra vez. Luna, que não estava conseguindo se equilibrar bem na barra, encaixou seu corpo entre as pernas da amiga, apoiando suas costas no corpo pendurado da moça de olhos claros. Os caras passaram outra vez, viram a cena, piraram. Faziam tanto esforço para chamar a atenção que irritava.
As duas saíram de lá, foram para o banheiro. Foi aí que aconteceu. Tudo vazio, entraram na mesma cabine. Ficaram. Na hora de sair, um engano de cálculo colocou as duas frente-a-frente com uma estranha que se maquiava no banheiro. Luna quase morreu de vergonha, embora não conhecesse a mulher. A jovem de olhos claros não se importou, não conhecia ninguém, ali ela podia ser qualquer pessoa. Até uma mais parecida com ela mesma. A noite foi longa, houve muitas risadas, muitas provocações e, as benditas palmadas no bumbum que Luna não dispensava em dar na amiga.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Capítulo 16

Casa da garota de cabelos castanhos, Outubro de 2009.

Ela conversava com a garota que havia se tornado sua primeira ex, mas que não deixara de ser sua amiga. Aquela à qual ela sente que sempre terá um carinho, apesar de tudo.
Discutiam sobre o aniversário da moça estar próximo, mas a jovem garantia a amiga que não haveria comemoração alguma naquele ano, sem festas de aniversário ou coisa parecida. Não havia tempo para fazer uma festa do jeito que ela queria, faltavam duas semanas apenas.
- Tem que ter uma comemoração, não pode passar em branco. Você está fazendo 18 anos.
Elas convesaram um bom tempo. A mineirinha teve uma idéia e passou para a moça.
- Vem pra cá. Fica na casa da minha tia, comigo. Já que não tem festa, viaja.
Os olhos verdes da garota brilharam, ela estava feliz e empolgada. Foi necessário alguns dias para convencer a mãe e outros para combinar tudo. No final da negociação, estava de passagem marcada para o dia 10, seu aniversário sendo no dia 11 e ela voltaria no dia 12, no final do dia, aproveitando o feriado.

Los Angeles, Califórnia, Outubro de 2009.

Angela estava pelas ruas, andando de bobeira. Tinha acabado de sair de um barzinho, onde tinha marcado de se encontrar com alguns amigos, e passava pela Hollywood Boulevard, olhando as estrelas da Calçada da Fama. Foi quando a viu.
Marg estava parada diante dela, alguns metros à sua frente, observando uma estrela de alguma personalidade que interessava a ela. Angela estava relutante ao se aproximar daquela loira que tanto quebrara seu coração, mas ao mesmo tempo, apesar de tudo o que sentia por ela em seu íntimo, toda mágoa, ainda havia carinho, e ela sentiu que era seguro aproximar-se.
As duas se cumprimentaram, conversaram de forma animada. Foi quando veio o convite.
- Porque não volta pra Vegas comigo? Por uns dias? Anda..vai ser legal.
Ela fixou seus olhos azuis nos da loirinha à sua frente, mas agora o cabelo de Marg estava alguns tons mais escuro, um caramelo talvez? Após algum tempo de insistência, ela disse sim. As duas marcaram de partir após alguns dias.

Terminal Rodoviário do Tietê, Estado de São Paulo. 10 de Outubro.

O dia finalmente tinha chegado. A moça de olhos verdes acordou cedo, às 7 da manhã, escolheu a roupa, se vestiu e pegou sua mochila, arrumada no dia anterior. Tomou café junto com sua mãe e partiram. Foi necessário um ônibus, um trem e alguns minutos de metrô, da casa da jovem até o terminal rodoviário onde pegaria o ônibus de viagem para Poços de Caldas, Minas Gerais, onde Luna morava com a tia.
Ela se despediu da mãe, subiu no ônibus, parado na plataforma 23, e esperou. O ônibus deu a partida, ela deu um último aceno para sua mãe, pela janela. E o ônibus se foi.
Horas depois, ouvindo música durante metade do caminho, um rapaz subiu no ônibus com a irmã, no terminal da cidade de Campinas. Eles estavam com a passagem em sequência, mas não era a mesma dos bancos. Ela estava no 17, ao seu lado o banco 18. Os dois estavam com passagens 18 e 19, ao contrário do que pensavam, não sentariam juntos. O rapaz apressou-se em sentar ao lado da jovem de cabelos castanhos, mandando a irmã pro banco do outro corredor, atrás deles. O ônibus estava cheio, não tinha como "escolher lugares".
Não demorou e o ônibus partiu em direção à Minas. Léo, o rapaz que havia se instalado no banco ao lado, era legal. Eles ficaram conversando sobre música, sobre os lugares de onde eram e pra onde iam, fizeram uma amizade nas horas restantes da viagem.